O Ministério Público do Trabalho de São Paulo e o Ministério do Trabalho e Emprego se preparam para passar um pente fino em empresas de tecnologia do Estado de São Paulo atrás de irregularidades nas contratações de profissionais de tecnologia da informação (TI).
Conforme o Sindicato dos Trabalhadores em Tecnologia da Informação do Estado (Sindpd-SP), há suspeita de irregularidades entre os cerca de 250 mil trabalhadores da área de tecnologia que atuam no Estado, sendo 150 mil registrados pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e 100 mil contratados como pessoas jurídicas (PJ).
“Há um alto índice de precarização do setor que precisa ser combatido, começando por São Paulo, que concentra 48% das empresas de TI do país”, diz Antônio Neto, presidente do Sindpd-SP, ao Valor.
Na terça-feira (13), Neto fez um alerta sobre a preocupação do sindicato em um encontro com o diretor-geral da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Gilbert Houngbo, em Genebra, na Suíça.
Pejotização e CLT Flex
A suspeita do sindicato é de que haja um alto índice de “pejotização” – contratação irregular em regime PJ de profissionais com vínculo trabalhista – ou de “CLT Flex”, termo usado para o registro irregular de um valor inferior ao salário real do funcionário em carteira e o pagamento de um valor extra por fora.
“Tem gente até contratando Microempreendedor Individual (MEI) com obrigações de CLT, o que é ainda mais ilegal do que a pejotização”, reforça Neto.
O presidente do sindicato explica que a fraude trabalhista na contratação PJ envolve pessoalidade, habitualidade, subordinação e onerosidade. “Se somente o trabalhador é quem pode prestar o serviço contratado, se o trabalho é prestado de forma habitual e com jornada para cumprir, se existe chefe e se há remuneração, está evidenciado o vínculo trabalhista”, informa o sindicato.
Tecnologia da informação
Os modelos de fiscalização dos contratos trabalhistas no setor começaram a ser discutidos no dia 26 de maio, em reunião que contou com Antonio Neto e o presidente da Federação Interestadual dos Trabalhadores em Tecnologia da Informação, Émerson Moresi, e representantes do Ministério do Trabalho e Emprego. Entre eles, o secretário de Inspeção do Trabalho Luiz Felipe Brandão de Mello e o diretor do Departamento de Segurança e Saúde do Trabalhador, Henrique Mandagará de Souza.
“Um caminho é a formação de parcerias entre Ministério Público do Trabalho, Receita Federal e Previdência Social para análise dos regimes de contratação das empresas de tecnologia por meio do eSocial [plataforma do governo federal que unifica informações fiscais, previdenciárias e trabalhistas das empresas]”, explica o presidente do sindicato.
A Superintendência Regional do Ministério do Trabalho e Emprego de São Paulo informou ao Valor que fará novas reuniões com o Sindpd, “nas quais o Sindicato apresentará estudo sobre onde se encontram as maiores quantidades de trabalhadores prejudicados” e que “estratégias de fiscalização serão estabelecidas de forma a impactar o setor”.
“O governo estuda ainda o compartilhamento de bases de dados entre Ministérios de forma a otimizar a fiscalização e reduzir as fraudes, utilizando tecnologia da informação para potencializar a força de trabalho”, completou a pasta.
Lei de cotas
O Sindpd também apresentou propostas para a fiscalização do cumprimento da Lei de cotas de pessoas com deficiência (PCD) nas empresas.
A Lei 8.213/1991 estabelece que empresas com um número igual ou superior a 100 trabalhadores devem preencher parte de seus cargos com pessoas com deficiência variando entre 1% e 5%, de acordo com o número de funcionários.
Desenvolvimento de software
No Brasil, o setor de tecnologia da informação e telecomunicações (TIC) encerrou 2022 com 1,17 milhão de profissionais em atividade, sendo 35% deste contingente (mais de 410 mil pessoas) atuando diretamente em áreas técnicas, segundo dados da Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação e de Tecnologias Digitais (Brasscom). O balanço divulgado em maio pela entidade informa alta de 6,1% sobre o volume de vagas abertas em 2021.
Entre os profissionais diretamente ligados à área de TIC, 70,7% atuam em desenvolvimento de software, 9,9% em infraestrutura e 9,4% em suporte, segundo a Brasscom.
Procuradas pelo Valor, as associações de empresas do setor disseram que já atuam contra a precarização do trabalho na área de TIC.
“Para a Brasscom, a informalidade é um problema no setor de TIC por estabelecer condições desiguais para empresas que disputam o mesmo mercado”, disse a entidade em comunicado.
De acordo com a pesquisa Pulso, da Brasscom, o índice de informalidade trabalhista entre profissionais do setor no país foi de 17,2% em fevereiro, aumento de 1,2 ponto percentual em relação à média histórica de 16% desde outubro de 2021. O índice considera tanto funcionários que ingressam em empresas provenientes de vínculos anteriores de trabalho informal quanto aqueles que deixam seus empregos para assumir trabalhos informais, informa a associação.
O diretor jurídico da Associação Brasileira das Empresas de Software (Abes), Manoel dos Santos, diz que “há uma lei que estabelece as regras sobre terceirização e o grande conjunto dos associados Abes, quanto optam por essa modalidade de contratação, seguem as determinações legais e não estão violando nenhuma regra”.
Santos disse ainda que o Sindpd “tem o direito e o dever de intervir ao encontrar, eventualmente, indícios de violação da lei sobre a terceirização”.
Por Daniela Braun
Reprodução: Valor Econômico
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