Pouco mais de um ano após o Google introduzir respostas geradas por inteligência artificial em seus resultados de busca, análises e relatos de proprietários de sites indicam que o recurso, lançado em maio de 2024, está causando uma queda acentuada no número de cliques nos links exibidos abaixo das respostas automatizadas.
Um estudo quantitativo da agência Ahrefs, especializada em otimização para motores de busca, divulgado em 17 de abril, revelou que o primeiro link exibido nas pesquisas com respostas automáticas sofre uma redução de 34,5% nos cliques em comparação com buscas que não utilizam o recurso. A análise comparou dados de 300 mil pesquisas realizadas em março de 2024, antes da ativação do AI Overviews, com o mesmo período em 2025.
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Diante do impacto negativo para sites que dependem do tráfego do Google para gerar receita com anúncios, a empresa anunciou no dia 20 de abril a criação de uma nova aba, o AI Mode, que responderá consultas usando modelos de linguagem. Especialistas alertam, porém, que a iniciativa pode levar a buscas sem nenhum clique em links externos.
Organizações de mídia e pesquisadores destacam que a mudança coloca em risco a sustentabilidade do jornalismo profissional e de criadores de conteúdo online, já que o faturamento por publicidade está diretamente ligado ao volume de acessos.
Em comunicado, o Google defende que a inteligência artificial permite que os usuários explorem mais conteúdo da web do que antes. “Os cliques originados das páginas de resultados com AI Overviews são de maior qualidade para os sites, indicando que os visitantes tendem a permanecer mais tempo nas páginas acessadas”, afirmou a empresa.
Em seu blog, a empresa destacou que, nos EUA e na Índia, seus principais mercados, o recurso aumentou em 10% as buscas por termos que geram respostas automatizadas. Segundo o último relatório da companhia, o AI Overview já possui 1,5 bilhão de usuários mensais.
O Google também ressaltou que o AI Mode é capaz de “realizar centenas de buscas, analisar diversas fontes e produzir um relatório detalhado com citações em minutos, poupando horas de pesquisa”.
Outro estudo, da consultoria Terakeet, aponta que páginas não mencionadas nos resumos automatizados sofrem queda no tráfego, enquanto as citadas ganham uma vantagem significativa. A empresa, no entanto, não revela os critérios para inclusão nesses resultados.
Em entrevista ao The Verge em 2024, o CEO do Google, Sundar Pichai, argumentou que os resumos de IA “aumentariam o número de cliques”, contradizendo os dados da Ahrefs.
Ferramentas como o Google Analytics não distinguem se o acesso veio de um link tradicional ou de uma resposta de IA, dificultando a avaliação do real impacto do recurso no tráfego.
“O lançamento do AI Overviews mostra que o Google está confiante em sua capacidade de satisfazer usuários com conteúdo gerado por IA”, afirmou Ryan Law, diretor da Ahrefs e autor do estudo sobre a queda de cliques, em publicação no LinkedIn. O aumento nas buscas sugere maior engajamento, fator crucial para a monetização no mercado de publicidade digital.
Embora o Google não detalhe quando os resumos de IA são exibidos, usuários observam que o recurso aparece principalmente em perguntas do tipo “como fazer” ou “o que é”. Temas polêmicos ou sem consenso na sociedade são evitados.
Conteúdos como tutoriais e respostas a curiosidades, comuns em portais de notícias e blogs especializados, foram impulsionados pelo próprio Google na última década. Agora, o AI Mode pode prejudicar esses sites, como alerta o Press Gazette, veículo britânico especializado em jornalismo, que critica o design dos links, que se confundem com o texto, reduzindo a chance de cliques.
Para Samira de Castro, presidente da Fenaj, as mudanças representam um avanço do “self-preferencing”, em que a resposta da IA se torna o destino final do usuário, em vez de direcioná-lo ao conteúdo original.
“Essa prática exige regulação urgente, pois ameaça a sustentabilidade do jornalismo e o direito da sociedade a informações confiáveis e plurais”, afirmou.
Paula Guedes, da Artigo 19, lembrou que, em regiões como a União Europeia e o Reino Unido, o Google é considerado um “gatekeeper” – empresa que controla o acesso a partes da internet e cujas decisões afetam todo o mercado digital.
“Com o AI Overviews, esse controle tende a se intensificar, concentrando ainda mais o poder nas mãos das big techs”, disse.
A ANJ e outras entidades, como Abert, Ajor, ABI e Repórteres sem Fronteiras, emitiram uma nota conjunta pedindo que o Cade investigue se o Google abusou de sua posição dominante ao usar conteúdo jornalístico sem remuneração adequada, como ocorre em outros países.
Diferentemente de concorrentes como OpenAI e Perplexity, o Google ainda não firmou acordos com veículos de imprensa para compensar o uso de seus conteúdos em modelos de IA.
(Com informações de Folha de S.Paulo)
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