Apesar dos apelos do presidente Lula para a equipe econômica encontrar mecanismos que garantam um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) superior a 3% neste ano, são grandes as chances de frustração geral. Com o aperto monetário promovido pelo Banco Central, mais a crise política que já inibe investimentos produtivos, dificilmente o Brasil ter condições de avançar a passos mais largos neste e no próximo ano. O dado mais alarmante do custo imposto pela política de juros altos foi divulgado ontem pelo BC. Somente nos cinco primeiros meses do ano, o país pagou R$ 64,985 bilhões em encargos da dívida pública, quantia 25% superior às despesas registradas no mesmo período de 2004. Por dia útil deste ano, o governo desembolsou R$ 630 milhões. “Um exagero’; como definiu, o professor Roberto Piscitelli, da Universidade de Brasília (UnE). O gasto diário com juros é maior do que todos os investimentos realizados pelo governo até 22 de junho último: R$ 506,2 milhões. Além de sufocar os cofres públicos, inviabilizando projetos sociais e investimentos em infra-estrutura, essenciais para garantir o desenvolvimento sustentável os juros altos estão matando o consumo, como ressaltou o economista Carlos Coradi, presidente da EFC Consultores. Endividados até o pescoço, os consumidores não estão conseguindo honrar compromissos. Entre janeiro e maio, os supermercados amargaram aumento de 12,55% no volume de cheques sem .fundos. O único alento para esse quadro sombrio veio da inflação. A Fundação Instituto de Pesquisas (Fipe) da Universidade de São Paulo (USP) contabilizou deflação de 0,15% no índice de preços ao Consumidor (IPC) na terceira quadrissemana de junho. “Se o problema era a inflação, chegou a hora de o BC começar a baixar os juros’; sentenciou Luiz Roberto Sampaio, diretor da Corretora DC- Planner.
Sem crescimento
Os consecutivos aumentos da taxa básica de juros (Selic) promovidos pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) estão custando caro ao país. O tamanho da fatura foi divulgado ontem pelo chefe do Departamento Econômico do BC, Altamir topes.
Apenas em maio, os gastos com juros da dívida pública atingiram R$ 13, 711 bilhões, totaliiando, nos cinco primeiros meses do ano, R$ 64,895 bilhões, o correspondente a 8,47% do Produto interno Bruto (pm), a soma de todas asrique;las produzidas naquele período. Por dia útil deste ano, os juros consumiram R$ 630 milhões, reduzindo a quase zero a capacidade do governo de investir em infra-estrutura e em projetos sociais.
Quando confrontados com outras despesas do governo, os gastos com juros se tornam assustadores. Um exemplo gritante está na reforma agrária. Os R$ 891 ,4 milhões desembolsados pelo Ministério de Desenvolvimento Agrário até o último dia 22 de junho corresponderam a um dia e meio das despesas com a dívida pública. Nos primeiros cinco meses, o endividamento do governo praticamente consumiu a soma dos orçamentos previstos (sem cortes) para os ministérios da Saúde (R$ 40 bilhões) e da Educação (R$ 25 bilhões) deste ano. “Olhando para esses números, fica uma certeza: não há como o país crescer de forma sustentável, reduzindo as desigualdades sociais”, disse o professor Roberto Piscitelli, da Universidade de Brasília (UnB).
Taxa real de 14%
O pior, ressalta o economista Carlos Coradi, presidente da EFC Consultores, é que não há perspectivas de os gastos com juros caírem a curto e a médio prazos. Mesmo com o Copom interrompendo o ciclo de alta da Selic, os juros reais (que descontam a inflação) continuam subindo. Ontem, bateram em 14,09%, o maior patamar desde fevereiro de 2003. Essa elevação decorreu da queda nas projeções de inflação para os próximos 12 meses, agora em 4,96%, segundo pesquisa semanal realizada pelo BC junto a cem instituições financeiras. Além do grande peso sobre os cofres públicos, os juros reais direcionam as intenções de investimentos das empresas. Quanto mais elevados eles estiverem, menos se investe na produção. O empresariado prefere manter o dinheiro aplicado, sem riscos, em títulos públicos.
Na avaliação de Luiz Roberto Sampaio, diretor da Corretora DC-Planner, as taxas de juros já poderiam estar abaixo dos atuais 19,75% ao ano. Ele reconheceu, porém, que parte do movimento de alta dos juros conduzido pelo Copom- foram nove elevações consecutivas, entre setembro de 2004 e maio último -foi necessário para conter o ímpeto da inflação. “Creio que uma taxa inferior a 19% seria perfeitamente factível neste momento”, assinalou. Para Sampaio, porém, o que realmente abriria espaço para uma redução mais acentuada dos juros seria um corte drástico nas despesas do governo. A seu ver, isso daria um choque de credibilidade junto aos investidores, que custaria muito menos do que manter juros tão altos.
Os três especialistas ainda chamaram a atenção para a composição da dívida líquida do setor público, que encerrou maio em R$ 957 ,5 bilhões, o equivalente a 50,3% do PIB. Desse total, 55,5% são corrigidos pela taxa Selic. Ou seja, a cada aumento de 1% nos juros, a dívida aumenta 0,32 ponto percentual num espaço de 12 meses. (VN)
Dívida preocupa
Ricado Allan
Da equipe do Correio
A agência de classificação de risco Moody’s distribuiu a seus assinantes uma análise positiva sobre a economia do Brasil, mas que deixa claro um fator ainda considerado negativo aos olhos dos investidores internacionais nos últimos anos: a dívida pública.
As restrições ficam por conta do tamanho e composição da dívida, além da parcela que vence no curto prazo (em até doze meses). “Essas vulnerabilidades ainda restringem a classificação (rating) do país”, assinala o comunicado, divulgado pela Secretaria do Tesouro Nacional.
Segundo os dados anunciados pelo Tesouro e Banco Central, a dívida federal fechou o mês de maio em R$ 887 ,9 bilhões. A Moody’s criticou a magnitude da parcela do endividamento que é remunerada pela taxa básica de juros (Selic), hoje em 57,84% do total. A participação dos papéis corrigidos pe10 câmbio, outro ponto observado pela agência, caiu a seu menQr nível desde 1999.
No momento, a exposição cambial é de 4,27% da dívida.
A dívida também é muito concentrada no curto prazo.
Do total dos títulos em poder do mercado, 42,8% vencem em até doze meses. Apesar do cenário preocupante, a agência ressaltou que houve avanços nos últimos anos e que o Tesouro tem trabalhado para alongar o prazo da dívida e reduzir os outros dois problemas apontados. “A relação dívida/PIB deve se estabilizar ou cair, apesar das altas taxas de juros”, previram os técnicos no texto.
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