SÃO PAULO – Empresários e trabalhadores do setor de tecnologia da informação estão promovendo uma força-tarefa junto a integrantes do governo federal para aprovar, ainda neste ano, uma espécie de “transferência tributária” para o setor. A ideia, gestada entre os empresários, está assentada na troca dos 20% que as companhias têm de recolher ao INSS quando contratam um funcionário com carteira assinada por uma taxa de 3% a 4% a ser cobrada sobre o faturamento. O sindicato dos trabalhadores em processamento de dados (SINDPD) de São Paulo costurou um acordo com empresários do setor e a movimentação de ambos, trabalhadores e empresas, já alcançou sete ministérios.
O discurso ouvido pelo Valor, por vezes, se confunde. “Os encargos trabalhistas no Brasil encarecem o emprego, deixando uma série de negócios com custo proibitivo”, diz Antônio Carlos Gil, presidente da Associação Brasileira de Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom). “O sistema tributário nacional é anacrônico. Os setores intensivos em mão de obra, como comércio e serviços, são punidos, porque os custos com mão de obra representam a maior parte dos gastos das empresas”, afirma Antônio Neto, presidente do SINDPD.
O projeto costurado entre empresários e sindicalistas ambiciona usar o setor como “cobaia” de uma reforma tributária mais ampla. Para ambos, o sistema, fundamentado na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), de 1942, precisa ser reformado para fazer frente aos novos segmentos econômicos – como os intensivos em mão de obra especializada. “Enquanto em uma indústria a folha de pagamentos responde por cerca de 7% dos custos totais, no setor de TI chega a superar 70%”, diz Gil.
Segundo dados da Brasscom, menos da metade dos 1,7 milhão de trabalhadores do setor no Brasil contam com carteira assinada. “Esse número poderia ser drasticamente reduzido tão logo o governo aprove nossa ideia de transferência tributária”, diz o presidente da entidade, para quem a Previdência não perderia arrecadação com a isenção integral da contribuição de 20% ao INSS. “Uma alíquota de 3% a 4% sobre o faturamento já praticamente deixaria estável a arrecadação. A diferença seria completada em três anos e, em cinco anos, a arrecadação será ainda maior, porque a formalização aumentará”, raciocina Gil.
Desde julho, o empresário já se reuniu com integrantes dos ministérios da Fazenda, Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Ciência e Tecnologia, Casa Civil, Planejamento e, há duas semanas, da Previdência. Os sindicalistas não ficaram para trás. O presidente do SINDPD, que também preside a Central Geral de Trabalhadores do Brasil (CGTB), se reuniu, na semana passada, com o ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha. “Ele foi muito receptivo. Queremos juntar os patrões e membros do governo num grande seminário para discutir o tema, em novembro”, afirma Neto. Procurado pela reportagem, o Ministério de Relações Institucionais não se pronunciou.
Há dois anos, o setor de TI foi contemplado por uma medida de desoneração na contribuição ao INSS. Por meio da MP do Bem, as empresas do setor que exportam softwares e serviços – como prestação por outsourcing – têm o recolhimento à Previdência reduzido pela metade, de 20% para 10%. “Os efeitos foram imediatos”, diz Gil. De acordo com levantamento da Brasscom, as vendas ao exterior de softwares e serviços de TI saltaram da faixa dos US$ 200 milhões exportados em 2006 e 2007, antes da MP do Bem, para US$ 800 milhões em 2008 e US$ 2,2 bilhões no ano passado. Para este ano, ele prevê exportação de US$ 4 bilhões.
Sindicalistas e trabalhadores concordam que os salários no setor são altos, pois os trabalhadores são especializados. “O presidente Lula foi nosso maior aliado nas discussões da MP do Bem. Ele e sua equipe têm grande sensibilidade para essas questões porque sabem da importância do emprego e do mercado interno para a economia”, diz Gil, para quem a força-tarefa com sindicalistas deve trazer resultados ainda em 2010.
O empresário Osmar Higashi, proprietário da empresa RSI, avalia que, caso aprovada, a medida de “transferência tributária” o deixaria com vantagem competitiva. Desde o início do ano, a RSI vem aumentando o quadro de funcionários. As contratações chegam a quase 10% dos 900 trabalhadores que a empresa tinha em janeiro, e Higashi espera fechar o ano com mil funcionários. “Todos eles são contratados com carteira assinada, algo incomum no setor, uma vez que as companhias costumam mesclar funcionários formais com outros que trabalham sobre a forma de pessoa jurídica”, diz. Higashi avalia que a ideia que está sendo costurada com o governo reduziria o peso da folha de pagamentos em seu negócio. “Como não fabricamos softwares, mais de 70% dos meus custos são com mão de obra”, diz. Os salários na RSI variam de R$ 2,5 mil a pouco mais de R$ 6 mil.
>> Matéria publicada por João Villaverde, no jornal Valor Econômico, em 8 de setembro de 2010.
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