Produtividade no Brasil – Se durante a pandemia a produtividade do trabalhador brasileiro se reaproximou da média global, em 2024 ela se tornou equivalente a menos de um quarto, em termos de riqueza, do que é produzido por um colega norte-americano. Conforme apontam dados da Conference Board sobre produtividade que, no caso do Brasil, está praticamente travada nos últimos 30 anos.
A instituição avaliou 131 países e gerou um ranking liderado por Luxemburgo, Noruega e Dinamarca. Já o Brasil ocupava o 78º lugar no ano passado, ficando atrás de outras economias da América do Sul, como Uruguai (48º), Argentina (56º) e Chile (59º). No entanto, o país ficou à frente de dois companheiros do Brics: da China, em 79º lugar, e da Índia, em 101º.
Para Daniel Duque, pesquisador e especialista em mercado de trabalho FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas), a produtividade do trabalho é o maior indicador de desenvolvimento do país.
De acordo com ele “algumas das medidas para aumentar a produtividade já são conhecidas, como melhorar a qualidade da educação, para que a população tenha maior capacidade de aprendizado e consiga manipular máquinas e ferramentas, tanto digitais quanto analógicas. O diagnóstico não é tão complicado, o difícil é como fazer bem-feito.”
A grande mudança se deu no ano de 2015. Até aquele momento a produtividade do Brasil se mantinha acima da média mundial. Naquele ano, cada trabalhador brasileiro gerava, por hora trabalhada, cerca de 20 dólares internacionais a preços de 2022 (em PPC, Paridade do Poder de Compra, unidade que evita distorções na comparação entre diferentes países).
Já em 2020, chegamos a encostar na média dos demais países. De acordo com especialistas, tal fato foi uma espécie de soluço durante o período mais crítico da pandemia, em que trabalhadores menos produtivos foram afastados e os mais produtivos passaram a ter um peso maior nas estatísticas.
No ano seguinte o indicador brasileiro voltou a ficar abaixo do resultado global em 2024, era de 21,44 dólares PPC —um patamar semelhante ao de dez anos atrás.
De acordo com dados da OIT (Organização Internacional do Trabalho), o brasileiro tem uma jornada média de 39 horas semanais. Dentro desse contexto, nossa produtividade fica atrás da de países com menor jornada de trabalho.
Entre os países do G20, a menor média de carga de trabalho fica com o Canadá, com 32,1 horas semanais e com apenas 9% dos trabalhadores fazendo jornadas de mais de 49 horas. Porém a hora trabalhada canadense gera em torno de 68 dólares PPC, o triplo do registrado no Brasil.
Dentro do grupo, os canadenses vêm acompanhados pela Austrália, Alemanha e França, com médias de 32,3; 34,2 e 35,9 horas de trabalho semanal, respectivamente.
Porém a produtividade não é refletida apenas pela carga horária, já que fatores como escolaridade e tecnologia devem ser levados em conta também. Formação é uma das principais lacunas aos trabalhadores. Já a dificuldade para renovar as estruturas é um empecilho às empresas.
Redução da carga de trabalho e fim da escala 6×1
O problema da baixa produtividade tem sido apontado como um dos principais obstáculos para redução da jornada de trabalho no Brasil. A discussão ficou em evidência no último ano graças a uma proposta pelo fim da escala 6×1 (seis dias de trabalho e um de descanso semanal). Apesar do discurso contrário do empresariado, o programa piloto da Semana de 4 Dias no Brasil terminou com maior produtividade registrada nas empresas que participaram do teste, além do aumento do bem-estar dos trabalhadores.
Em agosto de 2023, Renata Rivetti deu uma palestra na sede do Sindpd-SP (Sindicato dos Trabalhadores em Tecnologia da Informação de São Paulo), em São Paulo, e descreveu o projeto e a necessidade de transformar a atual realidade do mercado de trabalho brasileiro. Já em outubro do mesmo ano, o Sindpd recebeu a visita do Ministro do Trabalho, Luiz Marinho, que defendeu que o Congresso Nacional discuta o tema da redução da jornada de trabalho semanal.
“O modelo atual não gera aumento de produtividade e têm adoecido mentalmente os brasileiros”, defendeu, na ocasião, Rivetti. O Brasil é o 1º lugar do mundo em transtornos de ansiedade, 2º lugar mundial em casos de Síndrome de Burnout e o 5º em depressão. “Tem pessoas que se sentem culpadas por ter um dia extra. ‘Nossa, não estou trabalhando, será que eu sou produtiva?’. A gente foi criada em uma sociedade que hoje acredita que não pode parar. Isso não é produtivo. Ao contrário, está levando a gente para um esgotamento. Essa é uma realidade”.
A deputada Erika Hilton (PSOL-SP), apresentou em maio uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que propõe o fim da escala e a adoção de uma jornada de 36 horas semanais, dividida em quatro dias.
De acordo com o Datafolha a redução é apoiada por 64% dos brasileiros. 33% são contra e 3% não souberam responder. Na mesma pesquisa, que foi feita nos dias 12 e 13 de dezembro, a jornada de 5 dias por semana e de no máximo 8 horas por dia foi eleita como a ideal pela maioria dos entrevistados.
Naercio Menezes Filho, pesquisador do Insper, aponta que países mais ricos e altamente produtivos conseguem reduzir suas jornadas de trabalho, porém tais possibilidades dependem de características locais.
“Nos Estados Unidos, mesmo sendo um país produtivo, se trabalha muito, por ter uma cultura de trabalho. Na Dinamarca, a cultura é terminar o trabalho cedo. O Brasil tem essa dificuldade de baixa produtividade, por isso a discussão da redução de jornada chegou mais tarde aqui”, de acordo com Menezes.
Crescimento industrial
Já Clemente Ganz Lúcio, que é coordenador do Fórum das Centrais Sindicais, o alto crescimento industrial que o Brasil teve pelo segundo ano consecutivo em 2024 deve ser considerado. Isso coloca o país em condições de dar um salto em termos de produtividade.
“Precisamos insistir no outro lado, fazer uma transição que tem de estar associada a uma oferta contínua de formação. O nosso grande desafio é ter uma inovação que se espraie por toda economia, que possa também ser alcançada pelo trabalhador autônomo e pelo conta-própria,” afirma Lúcio.
Outro ponto importante, de acordo com Duque, é reduzir a rotatividade do mercado de trabalho. “A gente está vendo isso agora, por exemplo, com os gastos do seguro-desemprego que aumentam em meio a uma mínima histórica do desemprego. As pessoas ficam pouco tempo em um mesmo trabalho e isso impede severamente o aprendizado.”
Boas estratégias podem partir das próprias empresas: salários competitivos, planos de carreira estruturados e incentivo a formação dos funcionários são algumas alternativas.
Outro fator são os desafios estruturais enfrentados pelo Brasil, com fragilidades em transporte e energia, o que afeta a produtividade.
Existe uma tendência identificada pelas medições internacionais: embora exista uma tendência de melhora dos indicadores, países populosos e com industrialização mais recente tendem a aparecer em posições piores. O método utilizado por tais medições se baseia na comparação de dados do PIB com o número de trabalhadores empregados.
“É até esperado que a China ainda esteja atrás do Brasil, mas logo mais isso vai mudar, os chineses já ultrapassaram o país em PIB per capita (Produto Interno Bruto por habitante)”, ressalta, Duque.
Ainda assim, foi registrada uma melhora recente no Brasil. De 2023 para 2024, houve um aumento 3,9% de produtividade do trabalho por pessoa ocupada. É o único avanço por dois anos consecutivos desde 2017-2018 e o melhor resultado desde 2020.
Um relatório elaborado pela Conference Board, no primeiro semestre do ano passado, apontou que a produtividade global do trabalho tende a se recuperar, com maiores contribuições para o crescimento do PIB, o que reflete uma normalização das condições macroeconômicas pós-pandemia.
Após 2020, o crescimento do PIB foi motivado principalmente pela recuperação das horas trabalhadas. Agora, a expectativa é de que ganhos de produtividade sejam responsáveis pela maior parte do crescimento.
Entretanto, para sustentar essa tendência, é necessário superar desafios como a escassez de mão de obra especializada e o crescimento populacional desacelerando.
(Com informações de Folha de S. Paulo)
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