Fonte: Folha de São Paulo
Funcionários da Apple, do Google e da HP já participaram do clube da luta
Geeks usam teclados, bastões e ossos falsos em combates realizados na garagem de uma casa na Califórnia
BRUNO ROMANI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Na garagem de uma casa localizada em uma pacata vizinhança no coração do Vale do Silício, região da Califórnia que abriga as maiores empresas de tecnologia do mundo, um grupo de homens se encontra a cada três semanas com um único propósito: brigar.
Em horário comercial, a maioria deles trabalha desenvolvendo e aperfeiçoando os produtos e serviços tecnológicos que você está acostumado a usar; são funcionários da Apple, do Google, do Yahoo!, da HP, da Intel, da AMD, da Nvidia e de outras companhias do setor.
Mas, no espaço de chão cimentado com vaga para dois veículos, eles se transformam em lutadores e formam o Clube de Luta para Cavalheiros, uma instituição que abriga embates amadores de regras esgarçadas.
É impossível não lembrar do filme “Clube da Luta”, estrelado por Brad Pitt em 1999.
O clube nerd, porém, é real e foi concebido antes do lançamento da produção hollywoodiana. Ele é cria de Gints Klimanis, 42, engenheiro de software de uma companhia que determina atualmente os rumos da tecnologia e cujo nome ele pede que não seja revelado.
As brigas duram cerca de 60 segundos, mas podem alcançar até dez minutos.
Em média, oito pessoas por noite dão as caras na casa, onde mora o irmão de Klimanis. Mas já houve ocasiões em que mais de 20 homens se aglomeraram no pequeno espaço.
Ao longo dos anos, de 250 a 300 pessoas já passaram pelo clube -a rotatividade é grande. Alguns lutam por uma noite e desistem. Outros mudam de cidade e são forçados a parar. E outros tantos se ausentam, claro, por lesões e machucados.
Ossos quebrados (principalmente dedos e costelas), traumas na cabeça, lesões nos rins e inchaços nos joelhos e cotovelos são comuns.
Além disso, em quase todos os embates, armas inusitadas são usadas. Teclados de computador, tampas de privada, bolsas recheadas com latas de refrigerante, ossos artificiais feitos para cães, revistas femininas com centenas de páginas e cadeiras. Parece não haver limites.
Para participar, porém, é preciso receber um convite pessoal de Klimanis. O candidato, então, passa por uma curta entrevista.
É nesse estágio em que o futuro lutador aprende o mantra do clube: “Não aleije nem faça o seu oponente chorar”.
Estresse pode contribuir para a agressividade
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Gints Klimanis, o fundador do clube da luta nerd, pode ter razão quando diz que o grupo funciona como remédio para o trabalho.
Pessoas estressadas percebem aumento de impulsividade e raiva, disse à Folha Cristiane Gebara, especialista em medicina comportamental pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e coordenadora do Centro Psicológico de Controle de Stress. Isso seria resultado da elevação anormal do hormônio cortisol no organismo.
Ela cita um estudo feito no Reino Unido, no qual foi constatado estresse em 97% dos profissionais de tecnologia da informação (TI), uma área no qual os resultados rápidos são pedra fundamental.
Segundo Antonio Neto, presidente do SINDPD (Sindicato dos Trabalhadores em Processamento de Dados e Tecnologia da Informação do Estado de São Paulo), esse é um setor no qual o profissional vive os problemas do trabalho fora do horário comercial.
Para Cristiane, porém, existem mais alguns componentes que ajudam a explicar a razão pela qual as pessoas frequentam o clube. Uma delas é a sensação de pertencer a um grupo fechado, o que pode elevar a autoestima (embora isso seja mais comum em adolescentes).
Já o sociólogo Pedro Paulo Oliveira, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), diz que o grupo não tem implicações sociológicas. Para ele, os EUA são “a pátria onde você encontra bizarrices de toda ordem”, onde seus grupos estão sempre à procura de canais e vias de expressão. (BR)
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